“Crianças lhe foram trazidas para que lhes impusesse as mãos e orasse
por elas, mas os talmidim repreendiam as pessoas que as traziam. Entrentanto,
Yeshua disse: ‘Deixem as crianças chegar até mim e não as impeçam, porque o
Reino do Céu pertence a quem é como elas’. Depois de lhes impor as mães, seguiu
seu caminho”.
Mattityahu 19:13-15 (BJC)
Até que veio a adolescência.
Acho que por ficar com muito receio de as garotas não se interessarem por mim,
pela minha forma de ser, comecei a me fechar. Minhas verdades infantis, aquilo
que eu sabia sobre eu mesmo foram deliberadamente soterradas com a lama da
mediocridade. Mediocridade, como me explicou a Dra. Ana Mariza Fontoura Vidal,
é aquilo que é médio, aquilo que massifica e retira as individualidades. Assim,
de uma criança extrovertida, passei a ser um adolescente introvertido; de
engraçado a chato; de otimista a pessimista; ao final da adolescência e início
da juventude, desenhar se tornou mais raro. Até mesmo meu gosto por verde
passou batido por uns anos: me forcei a comprar roupas de outras cores, mesmo
sem querer usá-las. Tentava deixar de ser “eu mesmo” em diferentes níveis e me
diluir na Grande Massa, nem que fosse na marra. Só que não deu certo.
Como é difícil isso de fazer Lech Lechá[iii],
de “ir ao encontro de si mesmo”. A tradição judaica diz que as crianças têm uma
percepção muito elevada do mundo espiritual. Recordo-me de um texto que o
Rabino Nilton Bonder conta uma história em que pessoas de diferentes idades falando da
lembrança mais antiga que possuíam. Ao final da história, via-se que a pessoa
quanto mais nova fosse, mais ela lembrava da vivência espiritual que tinha tido
antes de nascer, do “Banco de Almas” por assim dizer. Quanto mais velha, menos
se lembrava, entretanto, mais próxima estava de retornar ao lugar separado pelo
Eterno, bendito seja. Quero me focar no primeiro caso. Acho que isso faz muito
sentido no contexto que Yeshua colocou: quem não retornar a “ser como criança”
não pode herdar esse Reino, que colocarei em um sentido metafórico. Nesse forma
que coloco, esse Reino é o cumprir a vontade do Supremo Rei. Aquele que cumprir
Sua Bendita Vontade certamente herdará um bom lugar em Seu Reino. Como as
crianças chegaram nesse mundo há pouco tempo, elas sabem, teoricamente, melhor
que os adultos qual é a Vontade do Rei, bendito seja Ele.
O livro “O Sagrado” [iv]
é um livro muito bonito. Fala do “segredo do segredo”. Eu não vou contar o que
é o “segredo do segredo”, acho que vale a pena ler o livro. Enquanto lia, percebi
que muita coisa que pensava quando criança possui validade hoje. E que eram
verdades mais profundas que as verdades que fui adquirindo no lamaçal da
mediocridade. Talvez possa ser esse um dos sentidos de quando Yeshua disse
sobre “nascer de novo”. “Nascer de novo” é uma possibilidade de se retornar a
essa Infância – e de que de lá ninguém saia. Acho que hoje meu trabalho é meio
de paleontólogo: com um delicado pincel, preciso ir cavucando e retirando esse
Lamaçal, com muito cuidado para não danificar o precioso material que ficou
soterrado. É necessário deixar à mostra o que foi desenterrado e expressar a
individualidade. Como disse o Rabino David Aaron[v],
é apenas assim que podemos expressar o nosso amor, seja pelo Rei, seja por
nossos semelhantes.
Concluo lembrando-me da Dra. Ana
Mariza, me contando sobre a percepção que teve ao visitar um museu sobre Pablo
Picasso: “ele passou a vida inteira para aprender a pintar como Criança...”
Edgard MacFraggin’
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